O objeto das Psicologias - Um ensaio sobre o estudo nas Universidades

domingo, 20 de fevereiro de 2011 0 comentários
Fragmento de uma apresentação oral do artigo "As psicologias na Universidade" realizado na semana da psicologia da UEL - 2010.

Existe um objeto único que pode ser considerado o objeto de estudos da psicologia?



            O “ser humano”, seja este humano enquanto sujeito inconsciente, ou ainda enquanto corpo. Penso aqui que este “ser” pode também representar a forma de um organismo agir no mundo, na sociedade, em si mesmo. Ser é verbo, ser humano é pegar um objeto e dar ele uma atitude em conformidade com o que conhecemos como a categoria de “humano”. Podemos pensar como os bichinhos de estimação quando domesticados, damos até mesmo sentimentos a eles que sabidamente não passam de projeções. Hoje em dia, algumas pessoas optam por animais de estimação ao invés de ter filhos, considerando-os até mesmo parte de sua família.

            Este objeto da psicologia – o humano – é desmembrado durante os mais diversos cursos de psicologia, assim como acontece nos açougues com os animais.  Durante cinco anos, ou quatro em alguns lugares, temos aulas de formas sobre como compreender as pessoas, ou ainda, segundo a pergunta de Freud, sobre o porque as pessoas fazem o que fazem. De alguma forma quando nos damos conta de que aquelas pessoas também correspondem a nós mesmos, vem um certo sentimento de estranheza.
           
            Fazendo uma leitura do texto “O Estranho” de Freud, Lacan faz uma análise lindíssima quando diz que Freud diz que o que é estranho a alguém é ao mesmo tempo algo profundamente íntimo. Na medida em que projetamos no outro e nos estranhamos com determinadas coisas é porque estamos tão íntimos que não somos capazes de reconhecer aquilo em nós mesmos. Em outras palavras, gostaria de colocar um adendo para clarificar este pensamento lacaniano. Aquilo que é estranho está paradoxalmente tão perto que não enxergamos devido à proximidade, mas quando vemos no outro, ou seja, longe de nós, temos a sensação de estranheza.

            Começo enfim a falar um pouco do que me propus neste ensaio sobre a prática e o estudo da psicologia.
           
            Temos em nosso curso muitos professores, e com eles alguns alunos, que se apegam aos dogmas das teorias e como no açougue pegam um pedaço de carne, nomeiam de picanha ou filé Mignon e estudam sobre aquilo, dizendo que sua proposta -teoria – estaria compreendendo o animal inteiro. Se tudo é carne, então tudo passa a ser filé mignon e a partir daí tudo passa a ser estudado e saboreado como filé mignon.

            Um açougueiro que tenha maiores conhecimentos, poderia dizer que aquilo não é filé mignon, mas uma parte da costela ao qual foi retirado o osso e a gordura. O dogmático e sua trupe logo irão enraivecer e dirão: “meu caro, você está muito enganado, você ainda é somente um açougueiro, este é um filé mignon assim como os outros mas diferente apenas devido a qualidade e disponibilidade das fibras devido a uma má formação nesta parte do animal.”.
           
            Pronto, aquela parte torna-se devido ao discurso científico um filé mignon, simples assim. Todo estudante deverá se contentar com a explicação mais que científica dada pelo encarregado do suposto saber.

            A psicologia não pode dizer sobre um homem, pelo simples fato de que, ela nada tem a dizer de diferente das outras práticas, ou ainda, ela estuda o homem, as relações, as manifestações comportamentais, o devir, o pensamento, as energias, mas por incrível que pareça em na maioria das universidades não há um estudo conjugado sobre o humano. Queria deixar claro este aspecto em que não encontramos na psicologia um estudo sobre o ser humano, pelo contrário, transformamos em objeto o verbo ser e o estudamos, transformamos em objeto e calcificamos, categorizamos, etiquetamos o que deveria ser infinito, o próprio homem.

            A dica que dou aos estudantes que estão ingressando nas psicologias, é muito simples, não abracem uma brasão, muito menos uma causa, tentem deixar de lado um pouco de si mesmo para entrar na conversa com aquele que se coloca em sua frente e que demanda algo que ele já possui, mas ainda não sabe ou não pode saber.

Marco Correa Leite.

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