Ás vezes em nossas vidas faz-se necessário um movimento contrário ao da existência, contrário ao da insistência para que a vida continue tendo seu doce sabor. Ás vezes preicsamos chegar na beira do precipício, sentir o vento que vem lá do fundo, abrir os braços e ali naquela pontinha gritar (não pulem, rsrsrs).
Des-existir, desistir dos planos, do que se tem sido até então, desistir para uma nova possibilidade real de ser. As crianças fantasiam sempre novas possibilidades quando brincam de faz conta, os adultos de alguma forma perdem esta capacidade de compreender que existem outras possibilidades, mesmo que apenas ensaiadas em forma de pensamentos, de sonhos.
Acho que Winnicot estava certo quando disse que os adultos também deveriam brincar mais. Uma piada, uma boa conversa animada, uma cervaja com os amigos, uma brincadeira de cócegas com a pessoa amada, tudo isso podemos dizer que é brincar. E quando brincamos pouco, sonhamos, nos sonhos somos aquilo que éramos enquanto criança, ora heróis valentes e destemidos, ora criancinhas choronas e assutadas fugindo de um mosntro que tenta sempre nos destruir.
Para as crianças ensaiar possibilidades é mais do que necessário, é belo, é puro, é a própria criatividade entrando em cena e com ela um mundo novo se abre. Para os adultos é difícil, os ensaios tem consequências reais, uma palavra não tão bem dita pode acabar com o dia, com a semana, com o mês, com uma relação, com uma amizade, com uma vida inteira. Os ensaios quando adultos não são brincadeiras, são ensaios reais de possibilidades reais onde o que se busca é a maior certeza de que o que será feito dará certo.
Ao final de uma jornada nos Estados Unidos, após 3 meses de trabalho me percebo sem nada, absolutamente nada para fazer ao não ser curtir minhas escolhas. Paro de escolher, escolher dá um trabalhão, e sou levado pelos meus amigos ao encontro de um outro Marco, um outro eu. Muito mais divertido, muito mais descolado, que não se preocupa se vai ou não comer, ou beber, ou se divertir, afinal de contas eu estava com meus amigos. Deixava a escolha e os planos para eles. Uma das únicas vezes que escolhi deu tudo errado, fomos parar em uma festa chata, que até que no final ficou meio engraçada. Outra vez pedi uma pizza, eu falei ao telefone e aquele monte de inglês me enganou como sempre acontecia. Por telefone não percebo o jeito da massa, o que vem na cobertura, muito menos sei o nome dos ingredientes, a pizza chegou e estava horrível, culpa minha, mas eu havia avisado antes.
Parei de ensaiar possibilidades de existir naquele estrangeiro e permiti que meus amigos fizessem as escolhas por mim (amizade de 2 meses inteiros, banheira suja de sorvetes, cuecas e meias molhadas na cama do feijão, ligações de madrugada para o quarto ao lado, entre outras coisas). As escolhas sempre eram certeiras, mesmo que tinha que ser aquelas de sair de casa num frio de 2º celsius (até menor) com um leve chuvisco para andar quase 1km para comer um sanduíche. Sim, essas escolhas malucas nos mostram como é divertido ser livre, como é bom não ter outro motivo na vida ao não ser o de viver.
A gente quando cresce perde muito tempo, muitas chances, apenas olhando para as possibilidades, calculando estatiscamente qual a maior probabilidade de dar certo na vida, e com isso, perde a graça da vida, a graça do inusitado, do estar em um lugar hoje e simplesmente aproveitar, simplesmente ser feliz.
É meus amigos, as crianças é que estão certas. Se estão em um avião se imaginam em um navio, se estão no navio se imaginam no avião. É loucura achar que isso é aproveitar o aqui e o agora, justamente parece-nos o contrário, mas não é, e sabe o porque?
As crianças não se prendem ao que é de fato, elas vivem o que elas querem viver aonde quer que estejam e isso faz toda a diferença. Viver o momento não quer dizer que você deva aproveitar o máximo de algo que está ali, afinal, o que está ali está ali e pronto. É aproveitar o máximo com o que você pode fazer estando ali. Eu estando em outro país conversava com as pessoas como se fosse americano, eles não sabiam que eu não era americano até abrir a boca, mas quando eu desembestava a falar, pouco me importava o que eles compreendiam o que importava é que eu estava ali, falando inglês, como uma criancinha que estando de castigo começa a desenhar na parede e, sem perceber, já está brincando lá fora mesmo que seja de mentirinha.
Desistir de si mesmo é um pouco disso tudo, deixar de viver tão centrado em si mesmo e começar a viver pensando o que eu posso fazer com isso que sou eu. Outras possibilidades, outras formas de ser, tentativas, erros, fracassos, mas tudo sempre somando com um punhado de aprendizados e de novas formas de se reconhecer, de existir.
Acho que essa experiência de, nem que seja apenas por um momento, desistir de si mesmo, deixar de querer tanto e ser levado pelo querer de um outro querido por nós, abre-nos uma outra possibilidade de ser, uma forma diferente de não precisar ser muito o que éramos antes, mas de ser um movimento, de um ser em movimento. Claro que da medo, mas o que é o medo senão a possibilidade de gostar e ter que mudar para melhor? Essas experiências não são de fato "imutantes", mas também, não mudam a pessoa da noite para o dia, muito menos você irá se transformar naquilo que mais temia.
Experimentar uma outra possibilidade real de existir é de alguma maneira a melhor ( e talvez única ) forma de vencer o tédio, de viver de verdade e não ficar preso em uma vida da qual há muito já se arrepende mesmo antes mesmo de ter começado.
3 comentários:
Menino, acho que daqui a um tempinho, você vai ter uma coluna em alguma revista ou jornal bacana!!!hehehe.
Estava com saudades de ler seus textos.
Beijãooo e saudades.
Gi
Amém querida... e que paguem muito bem :D... rsrsrsrs
Beijos
Oi Marco,
Não escolher também é uma escolha...
Porém, essa leveza de se deixar levar (uma escolha) nos faz tanto bem.
Viver cronometrando, advinhando, planejando tudo, controlando, definindo é pura asfixia...
e na asfixia o peito contrai, o ar é mínimo ou nenhum; tudo pesa
Leveza é bem melhor! Vamos nos permitir
Abç e parabéns pela sensibilidade de sempre
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